É PRECISO IR AOS EXTREMOS DE SI,
PARA QUE POSSA EXPERIMENTAR-SE POR INTEIRO !


Débora Vasconcelos

sexta-feira, 11 de junho de 2010

A ESTRANHEZA DO NOVO – 11/06/10


Ela não queria fechar a mala, sabia que a partir dali seria diferente, sentada em cima dela pensava se poderia sobreviver com tão pouco, se poderia conviver com tão muito que seus olhos teriam que vislumbrar.
Batia em forma de melodia o seu coração, uma canção que ela desconhecia e já anunciava a estranheza do novo.
Ainda com medo, passou o ziper e arrastou até o carro com certa dificuldade, como se além do peso houvesse um imã imaginário que exercesse uma força incondicional.
Deixou as chaves na porta para demosntrar a si mesma que nada mais ali lhe importava. Decidiu seguir.
Horas de carro e música chata, os bons CD´s estavam compactados em um arquivo no computador portátil.
A medida que se distanciava daquele lugar, se aproximava de si mesma e de sentimentos que não fluiam naturalmente, barrados pela razão.
Uma crise de choro, parou no acostamento, não conseguia mais dirigir, batia no volante, soluçava, gritava na escuridão de sua própria alma, que só então pode ver.
- Quanto tempo perdido? Ela se perguntava.
E tudo que ela se impedia de sentir veio a tona, pois já não tinha mais o relógio para lhe controlar.
E não dever satisfação era tão bom que lhe deu medo de encarar.
Começou a rir e se perguntar: - Como algo tão bom, pode causar tanto medo?
Ria e chorava, descontroladamente. Se acalmou depois de um tempo e voltou a dirigir.
Viu uma velhinha estendendo roupas numa casa beira de estrada. Parou o carro e pediu abrigo na maior cara de pau. Disse que estava precisando dormir, que pagaria pela estadia, mais que não podia mais dirigir.
A senhora relutou de início, foi até a garagem conversar com seu marido, voltou e disse que ela precisava pagar adiantado e em seguida abriu o portão pra ela colocar o carro no quintal.
Sorriu então com gratidão, algo que já não lembrava direito que existia.
Ali o mecanismo havia se quebrado.
Depois de um banho, a sopa estava na mesa, e ela admirava a cumplicidade do casal. Enquanto a senhora servia os pratos, seu esposo cortava as rodelas de pão, eles conversavam com respeito e atenção, então novas perguntas surgiram no coração dela: - Será que sempre foi assim? Será que sempre se deram bem? Ou será que a velhice foi a responsável por acalmar a pressa dos seus corações, pra que eles vivessem o lado belo do amor, a cumplicidade?
Por fim, se perguntou: Porque não fui digna de viver um grande amor, e tinha que me enfiar no trabalho pra não ter que conviver com o marido que acabei de deixar?
E pela primeira vez, admitiu que o erro também foi seu, por não saber a hora certa de parar, deixando tudo mais dolorido, pelo peso das palavras que não ficaram no quarto junto com a mala, mas que vira e mexe voltavam ardentes em sua mente.
E não se perdoou por ter deixado chegar a esse ponto, ultrapassando os limites do respeito.
E percebeu que buscar culpados sentada na varanda, sob um céu magicamente estrelado como aquele, era quase que pecado e que não iria mudar nada.
Agora a mala já tinha sido aberta para novas experiências, como ver estrelas, que há anos ela não reparava. A decisão estava tomada e agora ela teria que se acostumar com a estranheza do novo

Débora Vasconcelos

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